Comprei proteína, levei maltodextrina
Eu caí na promessa da proteína barata: sobre um suplemento adulterado e um fabricante fantasma
Não existem muitas marcas de beef protein disponíveis no mercado brasileiro, por isso fiquei curiosa para experimentar uma novidade que me foi recomendada. As informações do rótulo eram atrativas: apenas 3g de carboidratos e 27g de proteínas por porção. O principal ingrediente declarado era a proteína hidrolisada e isolada de carne vermelha, seguida por óleo de coco, aroma e adoçantes — nada que levantasse suspeitas.
Como o preço era pequeno e a curiosidade grande, resolvi ignorar meu próprio conselho de não usar esse como principal critério de escolha. Decidi arriscar.
Whey protein ou qualquer outro suplemento de proteína não se escolhe pelo preço. Explico os meus critérios no dossiê whey protein.
Algo que me chamou a atenção no rótulo foi a medida da porção, pois para que uma colher de sopa do produto pese 34g ele deve ser bem denso. Como referência, essa quantidade de um whey protein típico pesa cerca de 20g.
Quando o produto chegou, percebi que se tratava de um pó fino e leve, incompatível com o peso da porção declarada. Mas até aí não fiquei muito surpresa, porque infelizmente estou acostumada a ver erros desse tipo nos rótulos.
O susto
O susto veio quando meu marido consumiu o produto para testar a glicemia com um monitor contínuo de glicose. Pra quem não está acostumado a fazer esses testes, o gráfico da esquerda mostra estabilidade após o consumo de um whey verdadeiro. O da direita é o registro do que ocorreu nos testes com o produto suspeito: o primeiro deles foi misturando o pó com leite, e resultou em 172mg/dl - um impacto elevadíssimo, para os seus padrões.
Para tirar a dúvida, ele fez outro teste depois que a glicemia baixou, dessa vez misturando o pó apenas em água. Em poucos minutos o valor chegou a 190! A seta apontando pra cima mostra que a glicemia está subindo. Esse resultado ainda maior indica que o leite usado no primeiro teste minimizou levemente o impacto.
190mg/dl é um valor compatível com amido puro, não com proteína em pó.
Mais testes
Como foi a primeira vez que vimos um impacto assim após consumir um suplemento “de proteína”, ficamos curiosos pra saber o que ocorreria em um teste qualitativo com iodo. O objetivo foi comparar o produto falso com um whey verdadeiro.
Embora essa não seja uma metodologia padronizada, pois em casa não temos os controles de um laboratório, sabemos que o iodo reage com amido formando uma coloração intensa azul escura. No nosso experimento, usamos um copo para diluir cada um dos pós em água: um com whey protein e outro com o pó falso. Os testes foram feitos simultaneamente, com a mesma quantidade de pó e de água em cada um deles, na mesma temperatura.
Para surpresa de ninguém, o pó falsificado reagiu imediatamente, enquanto o whey verdadeiro permaneceu com a cor inalterada.
O fabricante fantasma
No mesmo dia, enviei um e-mail para o fabricante relatando o ocorrido, mas ninguém respondeu. A embalagem do produto não tinha nenhum telefone de SAC para contato e o site informado está fora do ar. Também não localizei nenhum perfil oficial nas redes sociais, o que me faz pensar que essa empresa nem existe.
Falei com a loja que me vendeu o suplemento. Eles imediatamente removeram o produto do site e conseguiram o contato de um representante que me reembolsou o prejuízo financeiro por PIX, prometendo enviar para análise o produto que seria devolvido.
Para mim, o mais importante é evitar que outras pessoas sejam enganadas. Imagine as consequências do uso diário desse produto para uma pessoa que precisa restringir carboidratos de alto impacto glicêmico? Imagine para um diabético? Isso, claro, sem falar na ausência de quantidades significativas de proteína, que era o objetivo da compra!
Suspeito que o conteúdo do pote era maltodextrina, um amido de rápida absorção e altíssimo impacto glicêmico. Se não esse, algum outro similar, mas uma coisa é certa: não era beef protein. Não sabemos se o produto saiu assim da fábrica, ou se ele foi adulterado em algum ponto no caminho até a entrega. Talvez a culpa não seja do fabricante, mas é sua responsabilidade impedir que isso volte a ocorrer.
Já se passaram dois meses, e até agora não recebi nenhuma explicação do fabricante.
Mais sobre suplementos de proteína
Tenho outro recado sobre suplementos de whey protein, mas este não está relacionado à composição. A marca Evolution Nutrition está com sérios problemas na entrega e no atendimento ao cliente. Nos últimos meses, recebi vários relatos de seguidores e amigos informando que não receberam produtos, tampouco conseguiram contato para reembolso. Se quiser evitar o incômodo, por enquanto é melhor comprar de outra marca.
Perdoe-mme, mas voltando ao assunto Evolution, essa foi a resposta que eu obtive através do WhatsApp:
"Olá, Reinaldo Pellegrino.
Sou a Camila e estou entrando em contato pois recebi a sua solicitação do Reclame Aqui.
Primeiramente quero pedir desculpas pelo transtorno e pela falta de retorno, devido a alta demanda os canais de atendimento ficaram congestionados em com isso aumentando o tempo de resposta, não é essa experiência que desejamos aos nossos clientes.
Nós tivemos um problema com o rótulo de alguns lotes dos produtos o que precisaram ser enviados para a fárica novamente para que possa ser feito a correção, e nesse processo de logística ocorreram falhas operacionais e consequentemente atrasando no envio de alguns pedidos. Mediante a esse problema, nós precisamos passar por um processo de troca de fábrica e infelizmente esse processo acaba sendo bastante demorado.
Nós estamos com a previsão de normalização entre duas semanas e eu estarei efetuando o envio de seu pedido imediatamente.
Deseja aguardar essa normalização?"
Sari, este é um dos motivos para não trocar meu querido whey por beef protein. Já tinha recebido um relato de um conhecido que tinha me informado sobre o aumento glicêmico após a ingesta do produto.
Quanto aos produtos da Evolution, consegui que me enviassem a encomenda após mais de um mês da compra. Alegam mudanças de fornecedores...